
Escrita por: Amanda Kassis
Este texto contém spoilers sobre o desfecho da temporada.
A reta final de ‘Murderbot’, o novo Sci-Fi da Apple TV+, acelera a narrativa e aposta em diversas reviravoltas e crescimento pessoal para esse grupo pitoresco de pesquisadores e sua Unidade de Segurança presos em um planeta distante.
No 8º episódio, ‘Foreign Object’, o roteiro esclarece quem é o inimigo por trás das sabotagens [e mortes] dos personagens: GrayCris, uma empresa de mineração que não segue a lei intergaláctica e deixa um rastro de sangue por onde passa. Em busca da localização dos vestígios arqueológicos deixados por espécies alienígenas extintas, aqueles encontrados pela Drª. Mensah (Noma Dumezweni) no início da temporada, esse grupo de mercenários massacrou DeltFall e, agora, vê nos hippies da PresAux a sua última chance de lucrar. Enquanto os cientistas debatem entre lutar ou se esconder, Murderbot é novamente afastado do grupo devido às desconfianças levantadas por Gurathin (David Dastmalchian) — o grande antagonista do ciborgue interpretado por Alexander Skarsgård.
Em um primeiro momento, o título do episódio parece referir-se à infecção enfrentada por Gurathin devido ao projétil em sua perna, mas o termo “corpo estranho” é uma analogia ao protagonista Murderbot, que constantemente enfrenta embates morais com o grupo devido às naturezas tão distintas entre eles. Primordialmente, é visto como uma máquina de matar em vez de um ser com livre arbítrio e sentimentos, que escolhe estar ali para protegê-los — ou, pelo menos, enquanto isso lhe for conveniente.
Nesse contexto, pensando na sobrevivência, o protagonista cria um plano para salvar a própria pele em ‘All Systems Red’ — o título é homônimo ao primeiro livro da saga de Martha Wells que inspirou a série. Entre idas e vindas de um plano praticamente suicida para a equipe, a Unidade de Segurança mantém uma carta na manga — sabendo que os humanos não concordavam com sua ideia sanguinária, precisa agir por si só. Porém, quando as coisas saem do controle, Murderbot se vê diante de um sacrifício final para salvar sua pessoa favorita, culminando em um momento verdadeiramente poético. Afinal, para um ciborgue que detestava pessoas e somente gostaria de ver sua novela em paz, há algo mais simbólico do que “morrer” abraçado a uma humana?
Bom, morrer não é exatamente o termo correto. No episódio final, ‘The Perimeter’, todos são resgatados do planeta. O personagem de Skarsgård, agora nas mãos da Corporation Rim, tem sua memória apagada e retorna às atividades como uma Unidade de Segurança genérica. Entretanto, apesar das diferenças, os humanos da PresAux nunca deixam um companheiro para trás e, após o ciborgue ter salvo suas vidas tantas vezes, chegou a hora deles retribuírem — e com sucesso! Aqui, a série não somente enfatiza qual é a essência do protagonista e quão profunda é a lealdade entre os personagens, mas também aborda o verdadeiro significado de “ser”. No decorrer da trama, Murderbot focou em sua sobrevivência ou na de seus clientes e, pela primeira vez, teve de contemplar o futuro desconhecido além de suas milhares de horas de novela ou de sua função de checar o perímetro.
Para uma produção tão breve e despretensiosa, ‘Murderbot’ surpreende com uma season finale repleta de significado. O típico destino do protagonista solitário de se unir ao grupo de amigos para viver em paz em algum canto da galáxia é substituído por uma vontade de desbravar o mundo ou, nas palavras do próprio ciborgue, “checar o perímetro”. Ele não quer que alguém decida o que deve querer ou fazer, mas descobrir por si só. A cereja do bolo? A confissão desse desejo àquele que lhe antagonizou desde o princípio, Gurathin, que inevitavelmente é seu maior semelhante — não importa o quanto ambos neguem.
Em pleno 2025, quando as inteligências artificiais estão cada vez mais presentes na rotina, ‘Murderbot’ entrega uma aventura vibrante, ácida e estranhamente profunda que levanta questionamentos sobre humanidade e a linha cada vez mais tênue entre o artificial e natural. “Ser humano” é mais do que pele e ossos ou livre arbítrio. Empatia, conexões, acertos e erros em uma jornada imperfeita tornam as pessoas mais humanas, enquanto ambição, crueldade e sede por poder podem afastá-los de sua essência. Por mais que tenha de lutar contra o rótulo de ser “alguém”, mesmo sem coração ou cérebro, o protagonista desenvolve sentimentos reais, sendo capaz de até se sacrificar em nome daquelas que considera importantes. “O meio faz o homem?” é uma pergunta complexa demais para ser respondida aqui, mas Murderbot é irrevogavelmente mais do que apenas uma máquina proficiente na arte de imitar.
Já está com saudades do seu noveleiro favorito e quer saber qual será sua próxima aventura? Não se preocupe! ‘Murderbot’ está renovada para sua 2ª temporada pela Apple TV+.
Nota: 8,5