Escrito por: Pedro Rubens
Hans Rookmaker (1922-1977), professor de Teoria da Arte, História da Arte, Filosofia e Religião, escreveu que “A arte não precisa de justificativa”. Por mais que o autor quisesse tratar de aspectos religiosos com relação à arte, reutilizo a frase que deu nome ao seu livro para falar sobre a nova produção da HBO.
We Own This City, série inspirada no livro de mesmo nome do autor Justin Fenton, acompanha a cadeia de crimes e tráfico de drogas que circulam pelas ruas de Baltimore. Ao passo que, conta os passos da cama de gato existente nas entranhas de um sistema policial corrupto e racista da cidade.
Se me fosse possível definir o piloto em apenas uma palavra certamente seria “arrebatador”. Desde o monólogo da primeira cena até os últimos passos acompanhando o protagonista, interpretado impecavelmente por John Bernthal, a série imerge o espectador de uma maneira maestral, nos colocando dentro da narrativa e causando um misto de emoções que vão do desespero ao ódio em questão de milésimos de segundo.
O roteiro de We Own This City tem vida própria. Não precisa de muitas palavras para passar a mensagem que deseja, mas quando o faz, é com excelência, vide a cena em que policiais voltam atrás numa determinada abordagem. Isso é arte! Isso não precisa de justificativa porque sua mente te leva automaticamente a diversos casos da vida real em que as coisas poderiam ser diferentes.
O texto é atual e na mesma proporção em que é simples ao falar tudo o que precisa ser dito, carrega uma profundidade gigante e gritante. Não tem deslizes e nem tampouco enrolação, a série vai lá e joga tudo no ventilador mostrando que a pincelada de ficção é apenas uma parte de uma obra de arte deplorável que retrata a nossa sociedade.
As atuações são correspondentes ao roteiro: afiadas, certeiras, carregadas de emoção e vazio, quando é necessário. Isso é fruto de um trabalho exemplar entre direção e elenco, que entregam tudo de si e proporcionam um espetáculo visual em 58 minutos de episódio. Logo eu, que não conhecia o trabalho de David Simon e George Pelecanos, já estou indo assistir tudo o que tiver a assinatura desses dois!
Não bastasse roteiro, direção e atuação, a fotografia segue a mesma linha e faz um trabalho genial. Seja nos momentos em que os personagens não falam nada, mas os takes vão mudando para mostrar a mesma cena de perspectivas diferentes, seja nos momentos em que a câmera segue a saída de um carro e espera a entrada de outro, tudo faz com que seja visualmente bonito, instigante e poderoso.
We Own This City corrobora o que Rookmaker falou: a arte não precisa de justificativa. Pelo contrário, ela precisa ser propagada! Essa com certeza é daquelas séries que vão ficar na memória martelando por muito tempo, causando desconforto e incômodo. Espero que isso não aconteça apenas comigo, mas que, de fato, seja mais um instrumento que nos faça abrir os olhos para o mundo aí fora, mas que está tão perto de nós.
Nota: 9.0